18 janeiro 2015

As Quatro Estações, de Vivaldi


As Quatro Estações, do compositor veneziano Antonio Vivaldi (1678-1741), pela Orquestra de Câmara Inglesa dirigida por Leonard Slatkin


As Quatro Estações são os primeiros quatro dos doze concertos para violino que Antonio Vivaldi compôs sob o título conjunto de Il cimento dell'armonia e dell'invenzione ("A luta entre a harmonia e a invenção", numa tradução livre; a palavra "harmonia" significa, neste contexto, o rigor e a racionalidade da aplicação das regras da composição musical), os quais constituem o seu opus 8. Este conjunto de concertos foi publicado em 1725.

Vivaldi fez corresponder a cada uma das suas Quatro Estações um soneto. Não se sabe quem foi que escreveu os sonetos; há quem diga que terá sido o próprio Vivaldi. Por outro lado, também não se sabe se os concertos foram escritos antes dos sonetos ou depois. No fundo, esta é uma questão irrelevante, pois há uma correspondência biunívoca entre os concertos e os sonetos. Os concertos ilustram os sonetos ou, se se quiser, os sonetos ilustram os concertos. Tanto faz.

Segue-se uma tradução dos quatro sonetos associados às Quatro Estações, tradução esta que é atribuída a Ricardo de Mattos.

A Primavera

1º andamento: Allegro

Chegada é a Primavera e festejando
A saúdam as aves com alegre canto,
E as fontes ao expirar do Zeferino
Correm com doce murmúrio.

Uma tempestade cobre o ar com negro manto
Relâmpagos e trovões são eleitos a anunciá-la;
Logo que ela se cala, as avezinhas
Tornam de novo ao canoro encanto.

2º andamento: Largo

Diante disso, sobre o florido e ameno prado,
Ao agradável murmúrio das folhas
Dorme o pastor com o cão fiel ao lado.

3º andamento: Allegro

Da pastoral Zampónia ao Suon festejante
Dançam ninfas e pastores sob o abrigo amado
Da primavera, cuja aparência é brilhante.


O Verão

1º andamento: Allegro non molto — Allegro

Sob a dura estação, pelo Sol incendiada,
Lânguidos homem e rebanho, arde o Pino;
Liberta o cuco a voz firme e intensa,
Canta a corruíra e o pintassilgo.

O Zéfiro doce expira, mas uma disputa
É improvisada por Borea com seus vizinhos;
E lamenta o pastor, porque suspeita,
Teme feroz borrasca: é seu destino [enfrentá-la].

2º andamento: Adagio — Presto — Adagio

Toma dos membros lassos o repouso
O temor dos relâmpagos e os feros trovões;
E de repente inicia-se o tumulto furioso!

3º andamento: Presto

Ah! No mais o seu temor foi verdadeiro:
Troa e fulmina o céu, e grandioso [o vendaval]
Ora quebra as espigas, ora desperdiça os grãos [de trigo].


O Outono

1º andamento: Allegro

Celebra o aldeão com danças e cantos
O grande prazer de uma feliz colheita;
Mas um tanto aceso pelo licor de Baco
Encerra com o sono estes divertimentos.

2º andamento: Adagio molto

Faz a todos interromper danças e cantos,
O clima temperado é aprazível;
E a estação convida a uns e outros
Ao gozar de um dulcíssimo sono.

3º andamento: Allegro

O caçador, na nova manhã, à caça,
Com trompas, espingardas e cães, irrompe;
Foge a besta, mas seguem-lhe o rastro.

Já exausta e apavorada com o grande rumor,
Por tiros e mordidas ferida, ameaça
Uma frágil fuga, mas cai e morre oprimida!


O Inverno

1º andamento: Allegro non molto

Agitado tremor traz a neve argêntea;
Ao rigoroso expirar do severo vento
Corre-se batendo os pés a todo momento
Bate-se os dentes pelo excessivo frio.

2º andamento: Largo

Ficar ao fogo quieto e contente
Enquanto fora a chuva a tudo banha;

3º andamento: Allegro

Caminhar sobre o gelo com passo lento
Pelo temor de cair neste intento.

Girar forte e escorregar e cair à terra;
De novo ir sobre o gelo e correr com vigor
Sem que ele se rompa ou quebre.

Sentir ao sair pela ferrada porta,
Siroco, Borea e todos os ventos em guerra;
Que este é o Inverno, mas tal, que [só] alegria porta.

NOTAS:

1 — Eu estranhei a palavra "Zeferino" no terceiro verso da primeira quadra do soneto dedicado à primavera. Zeferino é um antropónimo, cuja presença no soneto não faz qualquer sentido. No original em italiano está zeffiretti, palavra que se pode traduzir por "zéfiros", que são brisas frescas e suaves.

2 — A palavra "Zampónia", no primeiro verso do segundo terceto do soneto dedicado à primavera, refere-se a zampogna em italiano, que é um tipo de gaita de foles.

3 — A palavra "Suon", no mesmo verso, está errada com certeza. O verso em italiano diz: Di pastoral zampogna al suon festante. Isto significa "Ao som festivo da pastoril zampogna".

Comentários: 5

Blogger Unknown escreveu...

Sublime!

25 abril, 2017 03:17  
Blogger Fernando Ribeiro escreveu...

Absolutamente, caro Louis Allien.

25 abril, 2017 04:27  
Anonymous Elio Ramires Garcia escreveu...

Maestoso!!!
Bravo!!!

24 setembro, 2017 03:27  
Anonymous Anónimo escreveu...

foda pakarai
!!!!!

05 abril, 2019 02:09  
Blogger Rogério G.V. Pereira escreveu...

Maria João de Brito
a maior sonetista que eu conheço
merece vir aqui

vou-lhe dizer
para vir cá a correr

30 novembro, 2019 22:29  

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